João Adolfo Guerreiro
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Dois Rios, uma pistola de plástico e uma machadinha


Uma pistola de plástico num ônibus, no Rio de Janeiro, e uma machadinha numa escola, no Rio Grande do Sul. Ainda bem que, em nenhum desses casos recentes, os criminosos portavam armas de fogo, pois, se assim fosse, estaríamos agora possivelmente lamentando a trágica morte de um significativo número de pessoas, tragédia que vimos em fatos semelhantes aqui no Brasil, como na escola em Suzano - SP em março desse ano, ou mesmo em outros países, como os Estados Unidos, por exemplo.

Resido em Charqueadas, já estudei um ano no Assis Chateaubriand, logo é fácil sentir empatia por professores e alunos no drama por eles vivido. Assim como muitos que estejam lendo essa crônica, conheço gente que tinha parentes naquela sala de aula. A sobrinha de uma colega de serviço. Desta forma, não sei exatamente, mas posso imaginar o que pais, familiares e amigos sentiram quando souberam da notícia. Afinal, a maioria de nós possui filhos e filhas e os tem ou já os teve frequentando escola.

No sequestro carioca, como viajo de ônibus seguido, igualmente não sei no exato, mas consigo imaginar o desespero ou o medo que sentiram os ocupantes do coletivo. Em ambos os casos, a necessária solidadriedade social com as vítimas se dá em termos precisos: poderia ser um de nós ali, ou um dos nossos, mas eram, de qualquer forma, brasileiros, que compartilham conosco a mesma língua e a mesma nação, sendo vítimas da insegurança que grassa. Problema nacional, estadual e municipal, em capitais e demais cidades de grande, médio e pequeno porte.

É, assim, um problema social, comum a países tanto ricos, como o acima citado EUA, quanto pobres. Via de regra, países mais pobres e que apresentem maior desigualdade possuem índices de criminalidade superiores. O caso da Holanda, onde 24 prisões foram desativadas em 2017 por falta de "clientela", ilustra isso, por um lado, e o Brasil, pelo outro. Entretanto, as causas sociais da criminalidade não ressuscitam as vítimas e tampouco absolvem os bandidos. Explicam (socialmente), mas não justificam (individualmente). O X do problema é, portanto, identificar devidamente as causas da criminalidade específica e comum aos diferentes países e buscar as soluções preventivas eficazes, além das medidas punitivas devidas.

O atentado em Charqueadas ainda nos revela uma face mais extrema da solidariedade social que, concretizada numa ação individual tomada no calor do fato, salvou vidas, com certeza. E tal atitude veio de um professor estadual, membro de uma categoria profissional material e simbolicamente vilipendiada atualmente, que recebe seus salários parcelados e é alvo de críticas correntes na arena política. Embora isso não tenha relação direta com o caso, pois foi uma atitude reativa daquela pessoa, individual, isso serve para ver que, mesmo sendo parte integrante de um todo profissional que é desvalorizado, o professor demonstrou compromisso com seus alunos no seu local de trabalho, com os filhos dos outros, os filhos da gente. O professor está ali, na escola, sem nada que medie sua relação com os problemas de toda a natureza que surgem naquele espaço. Toda falha e todo erro estouram nele, como literalmente deu-se com a bomba caseira lançada dentro da sala de aula. A essa atitude cabe o adjetivo heróico, palavra que, de tanto ser usada de forma levianamente metafórica hoje em dia, parece até diluída de uma acepção concreta. Um herói de fato, o professor do Assis Chateaubriand, arriscou sua vida para proteger os alunos de sua escola, mesmo sem possuir o equipamento e o preparo de um policial. Ao tomar a atitude, correu o risco de ser morto. Um bravo, um corajoso, que demonstrou bravura e coragem igual à professora mineira que, em outubro de 2017, morreu salvando crianças numa creche incendiada por um segurança.

No Rio de Janeiro, a situaçao foi resolvida pela ação da polícia, treinada e equipada para tal. Negociou quando devia negociar e atirou quando devia atirar. Como poderia ter agido de forma diferente? Seria irresponsável o policial que, diante de uma situação de defesa de terceiros, não usasse o recurso do disparo de arma de fogo contra o criminoso no momento em que a oportunidade surgisse. A vida das vítimas vem sempre em primeiro lugar, para o policial, antes da vida dele e da do bandido, esse último tendo se colocado em situação de ser alvejado por, justamente, colocar a integridade física dos outros em risco. E se a arma não fosse de plástico? E se o criminoso, poupado, abrisse fogo contra seus reféns? A culpa seria, então, da polícia. Logo, ela agiu certo, mesmo sendo a arma de plástico e o sequestrador um jovem ficha limpa, assim como o agressor charqueadense e também os assassinos de Suzano; todos eles, igualmente, suidas de fato ou em potencial.

Detalhe esse, aliás, a ser levado em conta em uma análise posterior desses fatos: O que está tirando a sanidade de nossos jovens? O que os une numa cultura homicida inspirada por atos análogos cometidos no Brasil e no exterior? Como lidar preventivamente com esse tipo de situação? Semana passada, assisti uma mestranda do IFSul, residente em Arroio dos Ratos, psicóloga profissional, defender sua dissertação em Charqueadas, apresentando um produto educativo (https://www.portaldenoticias.com.br/ler-coluna/977/joao-adolfo-guerreiro-marco-historico-na-educacao-publica-em-charqueadas.html) que visa auxiliar no combate ao suicídio nas escolas, num trabalho preventivo que, ela mesmo me relatou, pode ser utilizado para detectar outros tiopos de desequilíbrio e encaminhá-los para o devido acompanhamento profissional.

Todavia esse é um problema social, a ser alvo de políticas públicas efetivas para o setor a atacar suas causas (prioritariamente) e suas consequências, eis que prevenir é melhor do que remediar o que pode ser irremediável. Ao contrário, a espiral infinita de criminosos, reféns, vítimas, heróis e policiais seguirá ad infinitum. De qualquer forma, ainda bem que lidamos com uma pistola de plástico e uma machadinha, e não com armas de fogo que, no Brasil, felizmente, ainda são de fácil acesso somente a policiais e, infelizmente, ao crime organizado, que visa ganho material em seus atos, não para jovens comuns enlouquecidos.
 
João Adolfo Guerreiro
Enviado por João Adolfo Guerreiro em 24/08/2019
Alterado em 24/08/2019
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