João Adolfo Guerreiro
Descobrindo a verdade/ sem medo de viver/ A liberdade de escolha/ é a fé que faz crescer.
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"Quem quiser saber quem sou,
olha para o céu azul" - Teixeirinha.


O domingo, 7 de maio, estava com um céu azul de presságio. O jogo era em Caxias do Sul, no estádio Centenário, casa do Caxias, último campeão gaúcho vindo do interior (*1), 17 anos antes. Os deuses do futebol estavam enviando mensagens para os riograndenses.

O time da colônia alemã foi fundado num 1º de Maio de 1911, durante uma comemoração entre empregados e patrões de uma fábrica de calçados. Assim, nasceu com os pés no chão, superando inclusive a luta de classes naqueles revolucionários anos iniciais do século XX, mostrando ser um clube parido sob o signo da unidade para estar acima de outras paixões que não o futebol. Não foi à toa que o branco e o azul foram escolhidos como suas cores: o céu, que está acima de tudo, onde as nuvens flutuam, olhando sobre todos. Novo Hamburgo, um clube com os pés no chão e a cabeça nas nuvens, sem contradição: altivez!

Desde o início do Gauchão vinha mostrando que 2017 seria o ano de concretizar o seu destino. Uma excelente campanha na fase classificatória, a melhor campanha. Invicto contra a milionária dupla Grenal, com um empate de 1x1 com o Grêmio em uma vitória sobre o Inter por 2x1 no Beira Rio. Acaso, para alguns; afirmação de incontestável virtude, para os que olham para o futebol além do paradigma Grenal. Para não deixar dúvidas, na semifinal, um empate na Arena contra o Tricolor, numa partida em que quase vira o jogo e vence. Um demonstração insofismável de força. Tanto que o gigante adversário poupou os titulares num jogo de Libertadores, em humilde respeito aos fatos em campo observados. Em casa, no segundo jogo, depois de sair atrás no marcador, o Anilado empata o jogo e elimina seu laureado adversário nas cobranças de penalidades.

Se havia dúvida, era para estar totalmente dirimida. Mas a arrogância típica da torcida Grenal em torneios no Rio Grande do Sul levou à flauta de alguns, sonhando com um hepta agora tido como já praticamente garantido. O paradigma dos portoalegrenses era insuficiente para perceber a realidade: Era Novo Hamburgo, não era Grenal. E assim, no primeiro domingo de final, mais uma vez, o Noia, com o pés sobre o gramado verde do Beira Rio e a cabeça sob o ceú azul, empatou em 2x2 com o Inter. Notem: mais uma vez, esteve sempre a frente do marcador. Não fosse isso suficiente a mostrar a mão dos deuses do futebol, some-se que os goleiros do adversário, ao final do jogo, estavam todos lesionados. Coincidência?

Então, voltando para a tarde quente de domingo no Centenário, mais uma vez o Anilado inaugura o marcador. Isso mexe com os brios do Internacional, que volta arrasador no segundo tempo, empatando logo aos três minutos. E a pressão transcorre até o final da partida, com os chutes colorados se perdendo pela linha de fundo ou parando nas mãos do guarda-metas hamburguense. O detalhe só assinalava o que viria.

Nas cobranças de penalidades, a trave parou os primeiros chutes colorados. Os deuses do futebol não só fiscalizam, também jogam. As mãos do arqueiro anilado novamente seguram outro chute. Bastou aos jogadores de linha cumprir sua obrigação e colocar o Novo Hamburgo na história, em cumprimento ao seu destino.

Uma equipe montada com tostão contra outras construídas com milhão; Davi contra Golias. A folha salarial do time, 180 mil reais, não superava o salário de alguns craques da dupla Grenal. Mas o desuses do futebol queriam mostrar mais uma vez, depois de 2000, que o esporte bretão não é só cifrão. Nos últimos 63 anos, apenas Renner (1954), Juventude (1998) e Caxias (2000) haviam superado as forças futebolísticas da capital (*2). Em 2017, o Novo Hamburgo, com todos os méritos, sem acaso ou sorte, entrou para esse seleto grupo. Campeão Gaúcho, acima de tudo, superando a todos, com os pés no chão e a cabeça nas nuvens.

Logo, respeito: não toquem flauta, batam palmas. Todos, tanto tricolores quanto vermelhos! É Novo Hamburgo, não é Grenal. É a história que foi escrita e já se encontra nos livros, para a posteridade.



(*1) - Cidades do interior que tiveram equipes campeãs do Gauchão: Bagé (3x), Pelotas (3x), Rio Grande (3x), Caxias do Sul (2x), Santana do Livramento (1x) e Novo Hamburgo (1x).

(*2) - Durante as décadas de 1910, 1920 e 1930, 9 equipes "não grenal" do interior que foram campeãs gaúchas eram da metade sul do Estado (exceção do Americano, em 1928, e do Cruzeiro, em 1929), que ainda era a região economicamente mais forte do RS; do título do Renner (1954) para cá, as 4 equipes "não grenal" campeãs são da metade norte, hoje industrializada e centro econômico do Estado, sendo que 3 são do interior. É possivel tirar duas conclusões a partir desses fatos: 1 - o futebol tem uma relação direta com a economia regional em se tratando de competitividade; 2 - de 1940 em diante, a força econômica da dupla grenal superou em muito as demais equipes, levando a uma grande disparidade no futebol gaúcho, o que resultou na redução expressiva de títulos das equipes pequenas e do interior e anulou a metade sul em termos competitivos.
 
João Adolfo Guerreiro
Enviado por João Adolfo Guerreiro em 07/05/2017
Alterado em 09/05/2017
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