João Adolfo Guerreiro
Descobrindo a verdade/ sem medo de viver/ A liberdade de escolha/ é a fé que faz crescer.
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Textos
Titanic, 100 anos do naufrágio:
o que vale uma vida?

 

O que vale uma vida?
A vida é o tempo que passa, onde existir é um ato radicalmente individual e viver é coletivo.
Viver é sobreviver, correndo riscos calculados.
E só o amor dá cor pra vida.
 
Em 1986, aos 18 anos, eu fiquei muito impressionado com um filme chamado “Aliens, o Resgate”. Achei-o um grande filme. Fui seis vezes aos cinemas de Porto Alegre assistí-lo, nos saudosos cines Imperial (na Rua da Praia) e Baltimore (na Avenida Borges de Medeiros). Seu diretor era James Cameron. Ao comprar a revista Cinemin que trazia uma imagem do filme na capa, fiquei sabendo dos bastidores e da importância do trabalho do diretor na realização dessa seqüência de Alien, o 8º Passageiro, de Ridley Scott. Virei um ”cinéfilo” de diretor, daí em diante.
 
No início 1997 fiquei sabendo que James Cameron, agora já um consagrado diretor (filmara os mega-sucessos O Exterminador do Futuro I e II), fazia um filme sobre o naufrágio do Titanic. Intui na hora que seria um dos grandes filmes de todos os tempos e que eu deveria assistí-lo, o que fiz umas 15 vezes no mesmo Imperial.
Estava certo em minha intuição, foi o maior sucesso cinematográfico que vi até hoje em Porto Alegre, muitas semanas em cartaz, sessões lotadas, filas de espera nos cinemas. Realmente, o impacto de ver pela primeira vez na telona o filme de Cameron é algo que até hoje recordo e que foi uma grande experiência para muita gente em vários cantos do planeta. Testemunhei isso (teve uma menina de um país que não recordo o nome que assistiu Titanic em todas as sessões que pôde, todos os dias, li num jornal daqui à época!).
Reflito que o sucesso do filme se deveu por questões para além dele mesmo, pois foi um filme-documentário, de carne, osso, sangue e muita água. Narrava um fato histórico repleto de significados que atravessa até hoje o tempo e se mantém firme no imaginário ocidental.
 
Uma história que todo mundo conhece, um dos “fato-mito-lenda” que marcou o século XX. Hoje, 14 de abril de 2012, faz 100 anos que o Titanic bateu no iceberg e amanhã fará 100 anos que ele afundou.
Um navio que era um ícone tecnológico, um prodígio da engenharia humana no início do século passado. E que foi a pique justo na primeira vez que singrou o Atlântico para atravessá-lo rumo aos Estados Unidos.
Hoje e amanhã muita gente em volta do planeta vai rememorar o fato, pensando sobre o mesmo, refletindo, assistindo novamente o filme de Cameron, lendo algum livro sobre o assunto.
 
O grande impacto do naufrágio foi a tragédia humana, a morte de várias pessoas, o fim abrupto de vidas que colocou a nu o que a existência de cada um vale a mesma coisa, embora a vida tenha um valor social que depende da posição social que cada ser que existe ocupa.
Nas tragédias da vida real os pobres morrem em sua maioria e os ricos sobrevivem em sua maioria. A tragédia real é o único momento em que podemos ver quem, independente da posição social, tem grandeza de espirito. No resto do tempo temos o teatro da vida onde muita gente que existe usa máscara, pois o que está em jogo são aparências, e não a existência.
O naufrágio mostra também a fragilidade da megalomania da humanidade. Didaticamente nos mostra, assim como o também trágico acidente com outro ícone tecnológico do século passado, o zeppelin Hindenburg, em maio de 1937, que a verdadeira grandeza desse mundo é a natureza. Nossos prodígios estão longe da sua perfeição e magnitude, demonstrando que a medida do homem é ele mesmo, e não a natureza.
Se a perfeição humana existisse mesmo que só em seus prodígios e ícones, o Titanic nunca teria afundado. Mas uma sucessão de erros técnicos e humanos, de imperfeições de carne e osso e de espírito, levaram-no ao fundo com a impossibilidade de salvar todas as pessoas a bordo, por falta de botes suficientes (e esse foi o erro mais concreto e simbólico de todos). Ou então o binóculo que sumiu? Um binóculo poderia ter evitado a tragédia, mesmo ante a enormidade de falhas que atuaram em conjunto para a mesma acontecer. Erros. Imperfeições de corpo e de mente em inter-relação. Até hoje essas coisas acontecem. E são tragédias anunciadas...
 
Hoje o jornal Zero Hora trouxe em seu caderno de Cultura uma edição especial sobre o naufrágio assinada pelo escritor gaúcho Sérgio Faraco que, em2006, lançou pela LP&M o livro O Crepúsculo da Arrogância, sobre o naufrágio.
No caderno ele conta por cima as interessantes historias de Morgan Robertson e de Willian Stead. O primeiro lançou em 1898 um livro de ficção (premonitório?) sobre um enorme e luxuoso transatlântico, Titan, que naufraga no Atlântico em uma noite de abril, chocando-se a estibordo contra um iceberg, sem botes salva-vidas suficientes...
O segundo era um jornalista inglês mundialmente famoso. Em 1886 publicou um relato ficcional sobre um navio a vapor que ia a pique e onde a maioria da tripulação e passageiros morria devido a escassos recursos de salvamento. “Isto é exatamente o que vai acontecer se os navios demandarem ao mar sem botes suficientes” – finalizava o texto. Detalhe: em 1912, Stead foi uma das vítimas que pereceram no Titanic.
 
1998. Estou no cine Imperial assistindo Titanic outra vez e, ao final, ao sair pelo corredor em meio à platéia, percebo sentados lado a lado três rostos conhecidos, às lágrimas. Minha irmã e duas amigas em comum. Conversamos e depois vamos embora juntos. Uma dessas amigas não esta mais entre nós.
2012 – É bem provável que eu assista ao filme de Cameron em casa com a minha filha hoje, conversando reflexivamente sobre o episódio.
 
A vida é o tempo que passa.
 
Uma vida é uma tênue luz amarela que brilha numa luminária fixada na parede de um cômodo. Existir é a claridade emanada pela mesma.
João Adolfo Guerreiro
Enviado por João Adolfo Guerreiro em 14/04/2012
Alterado em 16/04/2012
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