João Adolfo Guerreiro
Descobrindo a verdade/ sem medo de viver/ A liberdade de escolha/ é a fé que faz crescer.
Capa Meu Diário Textos Áudios Fotos Perfil Livros à Venda Livro de Visitas Contato Links
Meu Diário
29/06/2009 20h03
Coluna de Régis Bonvicino no IG - 2
Um outro texto sobre Michael, crítico, com o qual eu discordo em muitos pontos, acho-o até agressivo em certos momentos, mas que possui alguns bons pontos de vista.

Clichês sobre Michael Jackson
26/06 - 17:14 - Régis Bonvicino, especial para o Último Segundo
Leio e ouço, entre atônito e... risonho, os clichês da mídia brasileira sobre Michael Jackson. Os clichês evidenciam que não há, por aqui, indústria do entretenimento capitalista estruturada, e, em consequência, jornalismo de entretenimento com algum nível.
Sou da mesma geração que Jackson. É interessante observar como ele pauta sua própria morte. Os videosclips do álbum Trillher (1982) não existiriam sem um documentário do cineasta francês Jean Luc Godard, que, em 1968, filmou, num longa metragem, os The Rolling Stones, ensaiando a canção “Simpathy for devil” – a película ironizava, profeticamente, as revoluções ideológicas dos anos 1960 (marxismo-leninismo, movimentos de independência de países africanos, a contracultura, o maio de 1968 em Paris). Chama-se One plus one.
Dois anos antes, outro gênio do cinema, o italiano Michelangelo Antonioni (1912-2007), lançava Blow up, que, entre inúmeros outros aspectos, trouxe a primeira cena de nu frontal feminina do cinema de arte, com a cantora pop e atriz Jane Birkin; no Brasil, conhecido como "Depois daquele beijo", a obra inventou o primeiro vídeo clip de uma banda de rock: os The Yearbirds interpretavam uma de suas canções no final.
Não há clip mais efetivo do que esse, nem mesmo os trabalhos de Martin Scorcese (este um ótimo diretor) e John Landis, para as canções de Thriller – o obra prima multimídia de Jackson, um mestre em sua síntese de Rhythm and blues, soul, rock, Frank Sinatra (1915-1998), Hollywood e Fred Astaire (1899-1987) mas não um inventor, como foi outro músico negro Jimi Hendrix (1942-1970), que, em quatro álbuns, de 1967 a 1970, alterou a música contemporânea (e não apenas a cena rock ou pop) para sempre, trabalhos até hoje insuperáveis.
Jackson não tem, sequer, o refinamento musical de outros gigantes da Motown, como Marvin Gaye (nascido em 1939), assasinado pelo pai em Los Angeles em 1984.
Jackson, produto da "cultura" rock
O guarda-roupa de Jackson me lembra a capa de Seargent Peppers Lonely Heart Club Band (1967), dos Beatles, na qual a moda das roupas de exército foi lançada, todavia, naquele momento, como algum sentido crítico contra o autoritarismo e a guerra do Vietnã. Sem os Beatles, ele não existiria, igualmente. Sem a Pepperland, do filme Yellow Submarine (1968), no qual os azuis atacam a cidade, o amor, a música e as cores, Michael não seria nada.
Never Land – o nome de seu sítio – vem de Pepperland e é uma citação de segunda via de Walt Disney. Sua vida artística está em Yellow Submarine. Aliás, seu melhor trabalho (Thriller) é inferior, estética e politicamente, aos melhores álbuns dos Beatles como o White Album ou Abbey Road.
Não há trânsito entre elementos da alta cultura para a cultura de massas na obra de Jackson, como havia no trabalho da banda inglesa e de Jimi Hendrix, que fazia jam sessions de música eletrônica, rock, blues etc. Jackson não existiria também sem James Brown (1933-2006) e, sobretudo, sem Mick Jagger: toda a sua performance de palco vem do front man dos Stones., este muito mais afrontoso e inovador do que aquele.
Não ouso compará-lo com John Coltrane (1926-1967), Thelonious Monk (1917-1982), Miles Davis (1926-1991) e outros gigantes do jazz norte-americano. Jackson não chega perto de Jim Morrinson (1943-1971) e The Doors ou de Janis Joplin (1943-1970). Está longe de um Lou Reed. E a milhões de quilômetros do jovem Elvis Presley (1935-1977). Todavia, Michael quis a grandeza, foi buscar os grandes! Preencheu o último vazio da showbusiness!
Jackson é um produto da cultura rock, na qual se inclui Motown, em sentido amplo, que não saiu desses limites, o que não subtrai a importância de seus principais trabalhos e tampouco a devoção de seus fãs, mas, esta tem um significado nítido: a transformação da mídia (e da crítica musical) em press release da indústria do entretenimento. John Lennon (nascido em 1940) calou-se – em depressão profunda – depois de ser implacavelmente perseguido por Richard Nixon (1913-1994) e pela CIA em virtude de sua militância política pelos direitos humanos. Foi assasinado em 1980 e, de verdade, sabe-se lá por quem ou se a mando de quem. Jackson tornou-se garoto propaganda de Ronald Reagan (1911-2004), visitando-o na Casa Branca e emprestando seu prestígio ao político conservador, a serviço da impiedosa globalização do capitalismo selvagem, que, hoje, vigora.
Michael já era – como ele mesmo dizia – um veterano dos palcos, quando se tornou adolescente. Sua carreira acabou após o sucesso estético e de público de Thriller, aos incríveis 24 anos. Ele representa a infantilização da cultura ou a extinção da cultura pela infantilização. O que mais me fascina nele são seus conflitos, que não ocultou de ninguém.
Era um homossexual visivelmente assumido, mas, que desejava ter filhos. Encarnou a tentativa de superação da “feiúra” negra, tornando-se um monstro branco. Era fisicamente frágil, embora tivesse performance leonina nos palcos. Não foi atraente, como Jagger em seus anos de juventude, mas  “sexy”. Não quis, como qualquer um, envelhecer. Fez caridade e não política (ou seja, política de direita). Foi infeliz. Morreu infeliz. 
No Brasil, os conflitos dos “astros” como Chico Buarque, Gilberto Gil, Caetano Veloso se encerram tão logo a conta bancária começa a aumentar: transformam-se em burgueses e oligarcas – ao contrário de Michael. Recuso-me a falar de tolices maiores como Ivete Sangalo – o nada do nada. Por curiosidade, espiei a lista dos CDs mais vendidos hoje no Brasil e deparei-me com os padres Fábio Melo e Marcelo Rossi.
Jackson respondeu a alguns duros processos judiciais, com altivez. Fez fortuna, faliu. Vendeu 750 milhões de álbuns, aliás, sozinho deve ter vendido mais CDs do que a soma de todas as vendas da indústria musical brasileira em todos os tempos. Morreu como qualquer um, de um reles infarto do miocárdio, por overdose de si mesmo, no entanto, a indústria, vai, uma vez mais, usá-lo, para fabricar a maior morte do mundo. Não terá paz nunca.

Publicado por João Adolfo Guerreiro
em 29/06/2009 às 20h03